CAPÍTULO 2 - A NAÇÃO LAICA URUGUAIA

 

2.1. A nação laica uruguaia

 

Os momentos fundantes da gênese e consolidação da nação laica uruguaia vão desde meados do século XIX até os primeiros decênios do século XX. Devemos ressaltar que os “momentos políticos” são importantes para determinar o trânsito “da nação laica” a partir da nossa idéia inicial: a nação laica se torna visível enquanto religião civil da nação, ora sob a aparência de “espaços neutrais” (legitimados como possíveis em função dos valores presentes na religião civil da nação e assegurados legitimamente pelo Estado-nação), ora diretamente de espaços onde a religião civil é preponderante  através de seus mitos e representações emblemáticas (a escola, para o caso uruguaio é - valha a redundância - sob esta ótica, também emblemática).

O fato de que as idas e vindas da nação uruguaia tenha a ver com conjunturas políticas (e, sem dúvida, conjunturas sócio-econômicas), está ligado à verossimilhança da própria religião civil enquanto religião da nação. Se ela mesma deve representar a nação como totalidade e ao mesmo tempo viabilizar crenças e emblemas que possam ser mais ou menos representativos para a tal totalidade, sua eficácia residirá em suas possibilidades abrangentes enquanto a absorver e produzir ao mesmo tempo estes bens de identificação. A religião civil trabalha sobre uma totalidade: a nação.

Mesmo que o próprio Bellah (1975) reconheça a capacidade de transformação da religião civil, é importante levar em conta que ela mesma tem como limite a sua dimensão abrangente. Quando a religião civil não pode dar conta da heterogeneidade social  ou seja, produzir ou tomar mitos e representações emblemáticas cima das particularidades, ou quando surgem novos porta-vozes da nação - seja desde o Estado ou desde a sociedade civil (o que implica redefinir novamente a nação e a sua respectiva religião civil) - , é que o próprio projeto de nação atravessa por uma profunda mudança.

 

2.2. Construção da nação laica

 

Desde meados do século XIX até as primeiras décadas do século XX, apresentam-se as emergências mais beligerantes em relação ao processo de secularização e laicização no Uruguai em suas duas vertentes,  a saber: gestação de uma religião civil principalmente por parte do Estado e privatização de outras manifestações religiosas.

De acordo com Sansón, o percurso das secularizações e a laicização no Uruguai:

 

...fue un lento pero sostenido proceso de diferenciación de campos de acción e influencias. Se desarrolló durante las últimas cuatro décadas del siglo XIX y comienzos del siglo XX, coincidió con la modernización del país - época de transformaciones sustantivas caracterizadas por elementos tales como la industrialización, urbanización, afirmación de la autoridad del Estado, y mejoramiento de la producción ganadera para cumplir las exigencias del mercado internacional. (Sansón, 1998:26).

 

Corresponde ressaltar que esta modernização acabou, nos inícios do século XX cristalizando em uma modernidade de perfil político pluralista, na qual as elites politicamente preponderantes desenharam e redesenharam o projeto de nação.

O projeto de nação laica, levado a cabo por liberais, deístas, espiritualistas, positivistas, socialistas e católicos livre-pensadores e os diversos cruzamentos que possam ser pensados - caracterizou-se por, como ironicamente aponta Bayce, um avanço de  "...ideas liberales anticlericales, de la racionalidad científica positivista de cuño anglofrancés - aunque más francés- (...) contra el ancestro católico ibérico" (Bayce, 1992:2)[1] .

O enquistamento destas elites no Estado, e que dali  reformularão o próprio Estado e produzirão em grande parte o projeto de nação gerarão:

 

...un proceso fuertemente estatista (en el sentido de que sus principales promotores privilegiarán las vías institucionales y políticas para la concreción y difusión de sus ideas), al mismo tiempo que se identificó como uno de los objetivos prioritarios de ese “reformismo desde lo alto” que vanguardizó las transformaciones de las primeras décadas de este siglo. (se refiere al SXX). (Caetano e Geymonat:1997:37).    

 

Este “reformismo do alto”, faz alusão particularmente ao denominado “primer batllismo” ou “época batllista” (1905-1930 aproximativamente)[2], onde se traça o projeto de uma nação assentada em princípios democráticos pluralistas, com um Estado fortemente interventor na regularização social e econômica e, mesmo assim, com um conteúdo que, utilizando já uma terminologia existente na época, bem poderia ser definida como “progressista”.[3]

Eis aqui o ponto mais agudo para compreender o projeto de nação uruguaia que é consolidado nas primeiras décadas deste século.

Na medida em que este “reformismo  do alto” batllista foi o promotor da maioria das reformas sociais de vanguarda[4], cai-se no perigo de formular uma gestação da nação a partir  do Estado, sem considerar a incidência de outros atores sociais. Tal como o afirma Caetano:

 

Fue durante las tres primeras décadas del siglo XX cuando la sociedad uruguaya pudo completar su primer modelo de identidad nacional (...) Si bien Batlle y el batllismo adquirieron una inocultable significación en ese período, en este como en otros tantos aspectos, su acción se insertó - junto con otros actores relevantes- en el cuadro de una `aventura´ colectiva y conflictiva, que recogió fuertes herencias y las proyectó en nuevas síntesis. (Caetano, 1992:84). [5]

 

 

A situação inicialmente contraditória, e a busca de polifonias a partir do presente não pode, porém, fazer-nos esquecer o papel do Estado na constituição da nação uruguaia .

Se o Estado não foi o único gestor do primeiro modelo identitário (primeiro modelo de nação) convém esclarecer  que realmente tentou assumir a representação da totalidade (a nação) ao mesmo tempo que trabalhou largamente em sua definição:

 

...desde que el país y su nacionalidad fueron engendrados demiúrgica y leviatánicamente por un Estado protobenefactor, totalizante y crecientemente abarcativo de las demandas y ofertas sociales y de la representatividad grupal. (Bayce, 1992:3).

 

 

Porquanto a produção da nação laica - mesmo que não  deva ser remetido a um agente - tem de considerar em sua análise que o Estado uruguaio foi um dos principais fazedores da religião civil, ora produzindo-a, ora apropriando-se das produções da sociedade civil. O “ordenamento semântico” da nação corresponde então, principalmente ao Estado-nação, que a conformará.

Dentro deste ordenamento semântico, o laicismo beligerante que se desenvolve neste período deve ser analisado de forma similar ao caso francês: luta de classificações por quem enuncia a totalidade.

As condições que operavam para que o Estado se advogasse os principais empreendimentos para configurar a nação e o conseguisse com bastante sucesso, remetem a um conjunto de condições sem dúvida anteriores ao primeiro batllismo.

À fraqueza estrutural do Estado uruguaio da independência, atravessado por guerras civis e obtentor do monopólio da força só em 1904[6], corresponde-lhe também um conjunto de agentes com os quais deve colaborar em constituir e orientar, dada a ainda maior fraqueza destes últimos: "En la historia uruguaya,  la vida política  - el Estado, si se prefiere- fue siempre un factor tan `creador´ como la vida económica o social". (Barrán e Nahum, 1985:38)

Dentro deste processo de ordenamento estatal da nação, correspondeu-lhe a este assumir diversas funções que o afastavam da mera posição de arbitrar as diferentes forças sociais, para encarregar-se também de atividades socioeconômicas, empresariais, etc. Logo, o “reformismo  do alto” batllista pôde reconverter com fins sociais uma aposta que já se esboçava desde meados do século XIX, porém com outros objetivos (um simples modelo agroexportador).

Se admitimos, conjuntamente com Bourdieu, que

 

El Estado es el resultado de concentración de los diferentes tipos de capital, capital de fuerza física o de instrumentos de coerción (ejército, policía), capital económico, capital cultural o, mejor dicho, informacional, capital simbólico (…) que permite al Estado ejercer un poder sobre los diferentes campos… (Bourdieu, 1997: 99-100),

 

 

para o caso uruguaio, a formulação estatal implica a formatação de outros campos e a direta intervenção neles. 

Dentro da emergência e consolidação da nação laica, deparamos com um Estado que se deve principalmente atribuir a enunciação da nação e que, dada a fraqueza de outros agentes, possui inclusive a possibilidade (relativa) de “autonomizar-se” em relação à pretensão direta dos mencionados agentes:

 

Tal potencial fue adquiriendo el Estado por  esas ampliaciones sucesivas de su actuación en los planos económico, financiero, industrial, educacional, sanitario, de la vida nacional, que el diputado socialista Emilio Frugoni lo encontró “dotado de vida propia”, convertido “en una especie de nueva potencia social, casi autónoma”, “que no es ya (…) el mero receptáculo(…) de todos los intereses(…) de la clase capitalista(…) sino que vive, se desarrolla y se agita al costado de esta clase. (Nahum, 1993:13).

 

 

No processo fundacional da nação laica observa-se um Estado com pretensões totalizantes, com um campo de ação que transcende a esfera burocrática e, além disso, um conjunto de “âmbitos” a serem criados. Corresponderia então resgatar, mesmo para as etapas incipientes da secularização, a hipótese de Caetano (1995) relacionada com  o fato de que a luta entre Igreja Católica e Estado dar-se-ia ora em função da ocupação de âmbitos existentes, ora na gestação de âmbitos a serem criados.

O fato de que o Estado ultrapassa a sua fraqueza inicial e ajuda na maturação de outros agentes através da sua expansão, avisa já sobre uma vontade e uma necessidade monopólica de produzir a nação. Porém, o conjunto de choques entre Igreja e Estado não se devem remeter tão-somente a este último: se, por um lado, temos um Estado jovem, alimentado com as concepções típicas do século XIX de progresso social:

 

…Por otro, irrumpe como en el resto de América Latina una nueva Iglesia Católica que se `romaniza´ y se `reforma´ al mismo tiempo que se plantea firme contra lo que considera una invasión de sus atributos tradicionales, fruto de los avances de lo que ya qualificaba de `impiedad´ e `indiferentismo´.” (Caetano e Geymonat, 1997:46).

 

 

O processo de dirimir campos, constitui um aspecto notório da construção da nação laica, onde se entrelaçam lutas ínsitas ao campo religioso não separado nem claramente diferenciado do Estado, e ao mesmo tempo, intervenções estatais que determinam progressivamente quais são as suas áreas de ação, e qual deve ser o lugar ocupado pelas expressões religiosas.

A Igreja Católica, religião de Estado desde a Declaração da Independência (1830), até sua separação em 1917 (Ardao, 1962; Caetano e Geymonat, 1997; Da Costa, 1997, 1998 ;Pi Hugarte 1997),  dispõe-se, no seu processo de configuração, como um lugar de lutas entre diferentes correntes católicas entre si, especularmente com o Estado e com outros agentes do campo religioso.

Referimo-nos ao seu processo de configuração, dadas as características da Igreja Católica uruguaia. Bastaria aqui estabelecer as características da implantação do catolicismo no Uruguai:

 

La implantación del catolicismo en el Uruguay fue tardía -resultamos ser la última región colonizada por España en América del Sur- y coincidió con la hegemonía de la Ilustración borbónica antijesuítica, dos factores que debilitaron la influencia de la Iglesia. (Barrán, 1998a:19).

 

 

Para a época de independência (1830) "…los informes Vicariales hablan de 100 sacerdotes en todo el país…"(Faraone, 1970:12). Além do aspecto numérico, outro conjunto de fatores concorrem para mostrar as dificuldades que teve a Igreja Católica para se implantar:

 

…el alto clero no existió en el Uruguay colonial español ni en el  Uruguay independiente hasta el establecimiento del obispado de Montevideo en 1878. El bajo clero era muy escaso, con frecuencia italiano y poco conocedor de la lengua de la población, de pobre formación teológica y relativo nivel moral, circunstancias que perduraron todas hasta 1880-1890.  Los jesuitas, la `milicia´ encargada de velar la fe y el poder papal en los siglos XVII, XVIII y XIX, habían tenido muy breve historia en el Uruguay colonial pues llegados en 1745 fueron expulsados en 1767 por Carlos III." (Barrán, 1998a:19).

 

 

Além disso, a ausência de amplos territórios eclesiásticos (Faraone, 1970), a falta de peso corporativo da própria Igreja e a plena união e identificação com o Estado, "…no alcanzaron en ningún momento el carácter profundo y radical de otras partes del continente americano." (Caetano, 1995:6).

Suas minguadas forças em termos materiais e de recursos humanos, traduziu-se em que a Igreja Católica, apesar de cumprir enquanto religião de Estado com um conjunto de atividades públicas (casamentos, registro de nascimentos e óbitos, ensino, saúde, etc) não possuiu a capacidade de matrizar a cultura uruguaia pela via da sua “catolicização”.

Isto pode ser percebido nas dificuldades iniciais em enfrentar com veemência os primeiros impulsos que fariam desta religião uma questão “doméstica” e também, na falta de consistência do credo católico no seu processo de monopolização do campo religioso.

Visto desta perspectiva, não é de admirar que Montevidéu admitisse, desde 1843[7], e sem nenhum incidente notório, o culto protestante, tal é a afirmação de Barrán (1998a:20),[8] nem que as adscrições católicas se vissem necessariamente em oposição com o cultivo de outras visões do mundo.

É assim que a partir da segunda metade do século XIX começa a delimitar-se o que quer dizer “realmente” ser católico. Os jesuítas papistas ingressam na década dos 40 como agentes essenciais da “romanização” e organização da Igreja Católica uruguaia. A partir do acionamento desta facção do catolicismo começam a dissolver-se as porosas fronteiras que, por incrível que pareça, permitiam a circulação,  por âmbitos católicos e maçons Em seu processo de organização da Igreja[9], os jesuítas implicavam "…el inicio del reforzamiento de las relaciones entre Roma y las Iglesias locales. Por eso el conflicto se centra otra vez especialmente en los jesuítas.” (Methol Ferré, 1969:37).

A possibilidades de ser ao mesmo tempo católico e maçom - mesmo que o conceito católico-maçom  fosse utilizado de forma mais ampla para expressar o catolicismo liberal - constituía uma opção que abrangia uma boa parte do clero, a burguesia e a intelectualidade da época.

Este catolicismo liberal, alheio a qualquer problemática religiosa como bem lembra Ardao (1962), teve de enfrentar-se com o catolicismo ultramontano jesuítico cuja vocação era monopolizar o campo religioso e delimitar claramente em que consistia ser católico. As tendências católico-jesuíticas e católico-maçônicas[10] enfrentaram-se duramente, agindo o Estado (não esqueçamos que a religião católica era ainda  para a época a religião do Estado), ora como caixa de ressonância, ora como interventor direto das diferentes lutas no interior do campo religioso.

Por outra parte, em várias ocasiões e de forma progressiva, o Estado irá impor-se aos conflitos religiosos por meio da apropriação dos espaços de contenda (nesse sentido é que deve ser vista a secularização dos cemitérios, item que veremos posteriormente).

Seguindo Methol Ferré, o início do choque entre as duas correntes católicas apontadas

 

…se inaugura oficialmente en julio de 1856 con el nuevo Vicario Apostólico, el viejo José Benito Lamas, quien dirige a los fieles y al clero un comunicado recordando la prohibición de la Masonería por la Iglesia.  Es el comienzo de la quiebra de la difusa frontera que había existido hasta entonces entre la Masonería y la Iglesia Católica en el Uruguay. (Methol Ferré, 1969:37).

 

Outro elemento que levou a atritos entre a Companhia de Jesus e já diretamente com o Estado uruguaio foi um fato aparentemente de menor importância:

 

Una joven que deseaba ser Hermana de Caridad y no contaba con el consentimiento materno, había recibido una carta de un padre de la Compañía de Jesús que le aconsejaba -dentro de la más pura teoría evangélica como se encargó de señalar luego su superior-, obedecer el `llamado de Dios´ antes que a su madre. (Barrán, 1988:31).

 

 

A intervenção da Igreja dentro do seio da família - o “roubo” de filhas para os conventos - acrescentado aos questionamentos dos jesuítas dirigidos aos maçons, fez com que a Companhia de Jesus fosse outra vez expulsa do território uruguaio. O decreto de expulsão  (Ardao, 1962; Barrán, 1988) do dia 26 de janeiro de 1859, foi assinado por dois representantes netos da burguesia católico-maçônica da época: o Presidente da República Gabriel Pereira (1856-1860) e o General Antonio Díaz.

Apesar desta expulsão inicial, que só seria levantada em 1865, a versão ultramontana do catolicismo não seria derrotada já que no mesmo ano (1859) foi nomeado Vicário Apostólico Jacinto Vera, representante desta corrente.

Diversas pesquisas (Caetano e Geymonat, 1997; Methol Ferré, 1969; Sansón, 1998) concordam com que a nomeação de Jacinto Vera marca um novo tempo para a Igreja Católica uruguaia.

Se, por um lado, esta nomeação implicou uma reorganização da mencionada Igreja em sua estrutura eclesial, seu labor missionário e sua relevância a nível nacional, por outro, desatou um processo de virulência tal na sua afirmação anti-liberal, contrária ao pluralismo religioso e defensor dos espaços eclesiásticos à risca, que colaborou de forma significativa com os enfrentamentos que vieram ocorrer[11].

Com Vera, a versão ultramontana do catolicismo conseguiu consolidar-se, obtendo em parte os favores  do Estado no “ordenamento interno” da Igreja. Porém, se a expulsão dos franciscanos (1860) por parecerem diretamente vinculados à maçonaria[12], mostra de certa forma algumas  considerações da parte do Estado para com o magistério de Vera, por outro lado, as disposições em torno da secularização dos cemitérios em 1861, não deixava nenhuma dúvida de que o Estado iria tomar como política comum a expropriação daqueles espaços que originassem lutas e confrontações entre as diferentes facções da Igreja Católica.

A passagem dos cemitérios à órbita estatal aponta de forma bastante evidente esta política.

O enterro de um católico maçom em 15 de abril de 1861 e a negativa das autoridades católicas a dar-lhe sepultura no cemitério, foi o fato que provocou as disposições tendentes a tirar os cemitérios das mãos da Igreja Católica. Aliás, esta mesma negativa deu lugar a várias lutas dentro das hostes católicas, aproveitando então  o Estado para desterrar sem mais a pessoa de Jacinto Vera, considerada como um elemento perturbador.

A imprensa da época[13] coletada por Ardao (1962:165) parece bastante ilustrativa do espírito da época, em torno da mencionada situação:

 

¿Pero por dónde ha podido figurarse el señor Vicario facultado para negar sepultura eclesiástica a los cadáveres de los franc-masones que pertenecen a nuestra comunidad cristiana, católica, romana? ¿Cuándo se ha visto en Montevideo un hecho de semejante naturaleza? ¿Ignora el señor Vicario que toda la vida, desde los tiempos primitivos de la fundación de esta ciudad, ha habido en ella franc-masones, de los más respetado de esta sociedad, y que medio pueblo es franc-masón en el día, tan cristiano y tan católico como puede serlo el mismo señor Vicario, sin que jamás se le hubiese ocurrido a ningún prelado negarle sepultura o los auxilios de la religión y la entrada a la Iglesia de sus cuerpos inanimados?

 

 

Em 18 de abril de 1861, decretava-se a secularização dos cemitérios, passando sua jurisdição à órbita do Estado. Sua gestão ficava por conta das juntas econômico-administrativas que, não obstante, permitiam a presença "...de un sacerdote cuyo servicio se determinará por reglamento." (Caetano e Geymonat, 1997: 57).

Estes procedimentos secularizadores iniciais, por um lado assinalam os ajustes de conta entre as diferentes correntes católicas, vencendo a “romanização” da Igreja Católica uruguaia. O resultado foi que a Igreja já não teria capacidade para manter posições encontradas. O catolicismo liberal ou “maçom” derivaria em deísmo racionalista militante anticlerical (Ardao, 1962; Barrán, 1988, 1998a, 1998b), enquanto que o Estado uruguaio[14] alargará cada vez mais sua ação sobre as áreas costumeiramente consideradas católicas.

O olhar dos historiadores (Barrán, 1988, 1998a, 1998b) sobre estes primeiros traços secularizadores, dá conta do progressivo abandono da Igreja Católica por parte dos setores de “jovens cultos” montevideanos. No âmbito intelectual da época, aparece em 1865 “La Revista Literaria”, racionalista e anticatólica, que contava (entre outros) com a figura de José Pedro Varela, o futuro reformador da escola uruguaia.

Foram nestas publicações que pela primeira vez foi pedida a separação entre igreja e Estado e exposta claramente a oposição entre progresso material e social e catolicismo[15].

Um conjunto de instituições começam a ser fundadas, aglutinando correntes representativas das ânsias de progresso do século

XIX. Estes “modernos uruguaios”, já não enfrentarão a Igreja Católica em seu seio - ou seja o campo de luta vai transcender os choques entre as já apontadas correntes católicas, mas deixarão boa parte do catolicismo para passar a considerá-lo como uma interferência espúria ao pleno desenvolvimento social.

Embora  as tendências sejam várias, alguns autores resgatam duas etapas que as elites uruguaias teriam percorrido. Assim, Sansón assinala:

 

Una actitud racionalista ganó a las clases dirigentes que en el Uruguay se formaron bajo la influencia del espiritualismo ecléctico (escuela hegemónica entre 1850 y 1875  aproximadamente), y del positivismo (1876 en adelante). (Sansón, 1998:26).

 

 

Caberia pensar - sem nos aprofundar exaustivamente em todos os tons e matizes destas correntes - em uma modificação da posicão por parte de um setor  importante dos intelectuais da época e das variações de um campo intelectual, aproximando-se ao que, a posteriori, estabelecerá alianças - embora ambíguas - com o Estado uruguaio (a reforma escolar é um exemplo disto).

A concepção espiritualista iria manifestar-se pelo menos até 1860, relativamente conciliadora com a Igreja Católica:

 

no hay lucha contra el catolicismo, sino más bien se lo considera una etapa `inferior´, grosera, de una religión depurada superior, puramente `deísta´ y en que Jesús no es Cristo, sino el máximo ejemplo `moral´ de esa ley divina de la conciencia. (Methol Ferré, 1969:36).

 

Este deísmo começa a bifurcar-se entre aqueles que ficam nas fileiras da Igreja, por considerá-la em definitiva como “um fator civilizatório” e um deísmo combativo da igreja (que tem boa base na Universidade) e que já em 1872 proclama a “Profissão de fé racionalista”, tipo de deísmo que desconhecia qualquer tipo de Revelação.

Por seu lado, os clubes de “idéias” começam a surgir - o Clube Universitário, depois o Ateneo  e o Clube Racionalista, ambos combatentes do fervor católico. Em 1878 surge o jornal La Razón, que seria o porta-voz mais radical do racionalismo, afastado das águas do catolicismo.

Outra associação  a mencionar é a “Sociedad de Amigos de la Educación Popular” (agindo  desde 1868) que pregará a educação laica e que fertilizará  o terreno da futura laicização do ensino.

Deve-se ressaltar também a influência do positivismo, que adquire características peculiares no Uruguai. À diferença de outros países da América, as doutrinas de Comte não tiveram influência no Uruguai. O positivismo uruguaio foi herdeiro do evolucionismo anglo-saxônico de Spencer e Darwin, marca importante  tanto na Universidade e influência no sistema escolar por meio da reforma vareliana[16].

Durante o período denominado “militarismo” (1876-1886), aprova-se um conjunto de leis lesivas aos interesses eclesiásticos, dentro da lógica de um Estado centralizado e uma modernização de corte autoritário.

Mesmo que este período não contou com o apoio de uma parte importante dos intelectuais da época, estabelecem-se algumas alianças a serem destacadas (a reforma vareliana), e as medidas anticatólicas são acompanhadas favoravelmente. 

Com suas peculiares características, este Estado modernizador e modernizante, teve que se propor a segurança de um modelo agro-exportador

 

…con capacidad para imponer el orden en el medio rural, anulando la capacidad depredatoria de las guerras civiles y liquidando la vagancia y el abigeato que el alambramiento de los campos había incrementado. El Estado ideal debía, también, proporcionar asistencia técnica a la actividad económica fundamental del país, asegurar la universalización de la enseñanza primaria y asumir el control sobre el estado civil de las personas, todo ello con vistas a favorecer el desarrollo del sector agropecuario, tanto en sus connotaciones tecnológicas como laborales y sociales. (Zubillaga y Cayota, 1982: 113).

 

É durante o governo de Latorre (1876-80) que se emite a “Ley de Educación Común” (1877), de especial importância no processo de laicização e constituição da religião civil. Em 1877 José Pedro Varela assume o cargo de Diretor da Instrução Pública, oferecido pelo governo de Latorre, ingressando nas escolas um modelo de laicismo radical, embora atenuado no início pela possibilidade de uma educação religiosa “optativa”.

De acordo com Ardao (1962), esta posição em relação à laicização das escolas, já nada tinha a ver com as concepções relacionadas com o cristianismo.

A escola era tornada gratuita e obrigatória, fora da potestade da Igreja, e com educação religiosa opcional. O modelo era basicamente laico, motivo pelo qual a Igreja Católica se opôs fervorosamente. Os pontos de crítica se centraram no fato de que a educação religiosa deixava de ser obrigatória, acrescentado à possibilidade de que os cursos de educação católica podiam ser ministrados por qualquer pessoa.

Também, as críticas recaíram sobre o novo modelo de escola, de caráter misto, qualificado por Vera como “harém da educação”. Como forma de resistir a Igreja criou uma “Comissão de Damas Católicas”, que intentou várias vezes remover no Parlamento esta lei. Porém, o modelo de laicismo nas escolas vai radicalizar- se ainda mais e, em 1909, a escola passa a ser totalmente laica, proibindo-se todo tipo de educação religiosa.

O impulso inicial laicizante de 1877, se estenderá, durante o governo do também militarista Santos (1882-1886) a outros níveis educativos (“Ley de Educación Secundaria y Superior” de 14 de julho de 1885).

A segunda disposição sob o Governo de Latorre contrária aos interesses eclesiásticos foi a denominada “Ley de Registro Civil” (1879), onde se retira da Igreja também o poder legal para inscrever nascimentos, legitimações, matrimônios, óbitos.

Neste processo por parte do Estado de “ganhar espaços” é que se deve entender também as delimitações que impõe o governo de Máximo Santos (1882-1886) ao catolicismo. A “Ley de Matrimonio Civil Obligatorio”  de 22 de maio de 1885 estabeleceu que o único vínculo com efeitos legais era aquele realizado perante as autoridades competentes  e que devia ter lugar  antes do eventual casamento religioso.

A igreja respondeu estabelecendo que a lei dava ao matrimônio o caráter de um “simples concubinato civil”:

 

Para la percepción de muchos católicos se trataba (…) de una cruzada(…) a favor del demonio. La derogación de estas disposiciones , en particular la ley de matrimonio civil, pasaría a constituir uno de los objetivos centrales de la Iglesia Católica. (Caetano e Geymonat, 1997:94).

 

 

Este conjunto de disposições, acrescentadas à “Ley de Conventos” de 14 de julho do mesmo ano, pela qual ficavam proibidos os lugares à “vida contemplativa”, e tiravam validez jurídica (efeitos civis) dos votos do clero, indicam um espírito de época que transcendia o fato da luta por “espaços” com a Igreja Católica.

Enquanto a burguesia liberal resgatava as virtudes do cristianismo (sobretudo as referidas ao trabalho), também atacava o clero por "…desconocer el derecho de propiedad con su monaquismo y la práctica de bienes en común, así como su prédica contra el enriquecimiento como ideal" (Barrán, 1988:27).

Igualmente, um conjunto de críticas anticlericais referentes à “corrupção sexual”, à preguiça, à ambição pelos bens terrenos, constituíam uma prática comum do discurso liberal da época (Barrán, 1988:27).

Devemos ressaltar  que a eclosão anticatólica não teve nesta época como únicos participantes o Estado e as elites:

 

Mientras en las capas superiores de la sociedad se producía el enfrentamiento contra el clericalismo desde época temprana(...) en niveles más humildes repercutía a través de los inmigrantes garibaldinos, el conflicto político de la unidad italiana y los dogmas proclamados en 1864. (Faraone, 1970:12).

 

Uma importante porção da massa imigrante italiana era profundamente anticatólica em função do que se entendia como interferência do Vaticano frente à possível unidade italiana.

Methol Ferré insiste em que o jacobinismo batllista se teria alimentado deste anticatolicismo popular, produto mais das experiências ultramontanas italianas e espanholas trazidas a este parte do mundo do que da real experiência de convívio com a Igreja uruguaia:

 

La Iglesia Católica en el Uruguay no había sido nunca poderosa ni rica y no había razones para que se desencadenara un anticlericalismo tan profundo. Sólo quienes trajeron otra experiencia, otras razones, como gran parte de los italianos y españoles que llegaron, podían dar realidad a esa política. (Methol Ferré,1969:49).

 

 

Barrán aponta a popularidade do processo de “descatolização”:

 

El mundo rural, por lo general el baluarte de la religión católica en América Latina, en el Uruguay fue juzgado “tierra de misión” por los jesuítas en 1914, tan obviamente campeaba allí “la ignorancia” de la fe católica(…) De su lado, Montevideo experimentaba el avance más militante de la `impiedad´ anticlerical. El Censo de 1889 informaba que el 83% se había declarado católico y el 6% liberal. Transcurridos 19 años, en 1908, el Censo mostraba que los católicos habían descendido al 63% y los liberales al 25%. El avance de la `descatolización´ era mucho mayor entre los hombres que entre las mujeres, como en todo Occidente por otra parte. En Montevideo y en 1908 un 34% de éstos se declaró liberal contra un 15% de aquellas, cifra empero elevadísima(…) En 1908, los católicos ya eran minoría entre los hombres uruguayos pues sólo llegaban a ser el 44%. Los liberales casi los igualaban con un 40%. (Barrán, 1998a: 21).

 

O anticlericalismo militante mostrou-se nas ruas com manifestações massivas desde 1892 chegando  a reunir  15 000 pessoas em uma cidade que naquele ano tinha 200 000 habitantes (Barrán, 1988:8)[17].

Por seu lado, a partir de 1890 e 1900, acrescentar-se-á ainda com mais força o anticlericalismo anarquista e socialista, influência não menor no jacobinismo que se desenvolvera do Estado a partir do batllismo.

Perante este anticlericalismo,  proveniente de  várias frentes e que sem dúvida penetrava fundo em boa parte da população, a Igreja Católica assumirá duas posturas: proteger-se enquanto igreja “cercada” (no sentido em que sua incidência vai sendo progressivamente reduzida e  diretamente atacada) e participar - permeada também pela “racionalidade” que supostamente guardava a religião civil - de uma secularização interna. Tratar-se-ia, por conseguinte: "… de un catolicismo delimitado en su sobrenaturalidad porque se adaptó a una funcionalidad social volteriana.” (Bayce, 1992:3).

Durante a etapa do catolicismo romanizado e intransigente de Vera e Yeregui até a chegada de Soler, melhor negociador mas tão romanizado quanto os anteriores, quer dizer, questionador do racionalismo,  racionalismo positivista, liberalismo, protestantismo e apologeta do papado (Methol Ferré, 1969), a Igreja Católica fecha-se sobre si mesma progressivamente e embora havendo preocupação pela evangelização, insistir-se-á mais em gerar redes que “contenham” os fiéis da fugida do catolicismo.

Na segunda metade do século XIX o catolicismo pluraliza-se de certa maneira:” "Van llegando a nuestra tierra numerosas Ordenes y Congregaciones(…) Con ellos, la Iglesia va creando especialmente una gran red de establecimientos educativos…” (Methol Ferré, 1969:47).

Esta rede de centros de ensino, acrescentado ao associativismo católico (entre 1889 e 1911 realizam-se quatro Congressos Católicos e funda-se o Clube Católico) e a utilização da imprensa para pregar a doutrina (“El Mensajero del Pueblo”, “La Semana Religiosa”) serão a base para uma Igreja “militante” e uma Igreja de “ghetto”.

 “Militante” enquanto defesa da Igreja como dimensão incontornável para a construção da sociedade, não admitindo assim a “independência” do Estado da sua tutela, nem considerando que existisse a possibilidade de “moralizar” a sociedade fora da moral católica. Também militante enquanto questionadora do pluralismo religioso (ataque contra o protestantismo), do liberalismo e de qualquer concepção que pusesse em dúvida seu papel de reitor e representante de Deus na Terra.

Quanto à Igreja como ghetto, tal expressão aponta: "…una separación entre ella y el mundo, entre la ortodoxia y la heterodoxia" (Sansón, 1998:43).

A Igreja uruguaia, dado os ataques “do mundo” vai preferir - através do associativismo, centros de educação e reunião - estabelecer um cordão sanitário entre sua freguesia e “o mundo”, já perdidamente não católico.

Este perfil, em parte de “autoprivatização”, de recolhimento sobre si mesma, será o resultado do processo histórico esboçado, acrescentado à sua etapa mais radical - a do jacobinismo batllista - que erradicará a Igreja do âmbito público.

O primeiro batllismo, foi o gestor do processo radical de privatização das religiões “particulares” e do estabelecimento das bases da religião civil, tomado  das diversas fontes propostas já no século XIX.

Mesmo assim, este reformismo “do  alto” mudará claramente o quadro do Uruguai retomando, porém, heranças decimonônicas. O papel do Estado há de aumentar de forma exponencial, mas já não unicamente para assegurar uma ordem interna e configurar-se como o agente civilizador de uma dicotomia barbárie versus civilização. Este reformismo “do alto” configura uma aposta de aspirações democráticas, que deveriam ser matrizadas consensualmente. O reformismo batllista se apresentará como:

 

…Una ideología, entonces, finisecular, alimentada en el pensamiento enciclopedista, la creencia en el progreso indefinido a través de la ciencia y la difusión de la educación, y el rechazo al `prejuicio religioso´ como factor explicativo del mundo y del hombre. El reformismo se pensó a sí mismo y se vió como un hijo de la `Gran Revolución´, y es este, por ciero, uno de los tantos puntos de contacto que tiene con el contemporáneo Partido Radical-Socialista Francés. (Barrán e Nahum, 1985:39).

 

 

Do seu lado, o Estado deveria ser o instrumento de elaboração e estabelecimento de uma concepção ético-racional do mundo. Para isso, o Estado deverá trabalhar para gerar condições igualitárias para seus cidadãos:

 

Concebido como el representante de toda la sociedad, inclinará la balanza del lado del débil cuando la estructura económica, social o cultural haya colocado el fiel del lado de los fuertes, los privilegiados, los menos. El Estado deberá ser (y podrá ser) el corrector de la injusticia(…) Para ello abandonará su viejo papel de "juez y gendarme" e intervendrá directamente en la economía y la sociedad. (Barrán e Nahum, 1985:40).

 

 

A vertente “jacobina” expressa em um anticlericalismo à risca, e que gerara, com todas as diferenças, uma mútua influência entre anarquismo, batllismo e socialismo (além dos diferentes tons proletaristas), produziu, a partir do Estado, um conjunto de medidas anticlericais acrescentadas à expansão de uma religião civil “igualitária” e hiperintegradora da cidadania, tendo como referente o Estado enquanto ponto (paternalista) de eqüidade.

Utilizemos um quadro cronológico para ilustrar as medidas anticlericais no período batllista.

1906 - Retirada de imagens religiosas dos hospitais.

1907, 1910, 1913 - Leis progressivas sobre o divórcio, que acabam na medida “revolucionária para a época” de autorizar o divórcio pela vontade única da mulher no ano 1913. Corresponde assinalar aqui que esta medida levantou particular resistência, permitindo que a Igreja Católica organizasse hostes de mulheres que apresentaram múltiplas manifestações contrárias a este projeto, sem maiores resultados.

1907 - Eliminação do juramento sacramental para os legisladores: “Igual medida se tomó en 1911 se tomó para el juramento de los ediles. Para el del Presidente de la República, por estar establecido en el texto de la Constitución, debio esperar a la reforma de ésta.” (Ardao,1962:394).

1909 - Implantação do ensino laico nas escolas públicas,  radicalizando o modelo de escola laica, gratuita e obrigatória da reforma do ano 1877. Abrange também a formação secundária (colegial). Desde 1877 até 1909  "…la enseñanza era laica en el plan escolar, pero incluía catecismo católico obligatorio, del que podían sutraerse los alumnos cuyos padres así lo indicaran."(Faraone,1970:36).

1910 - Monopólio na gestão da assistência sanitária pública por parte do Estado.

1911 - Supressão de toda referência religiosa no Código Militar. Supressão de honras e sacramentos nos ritos militares.

1917/1919- Separação formal da Igreja Católica  do Estado.

1919 - Mudam os nomes dos feriados católicos.

Natal passou a chamar-se “Festa da família”, a Semana Santa “Semana do Turismo”, o dia 6 de janeiro deixou de ser Dia dos Reis para passar a ser “Dia da Criança”. O Dia da Virgem (8 de dezembro) recebeu o nome de “Dia das Praias”.

Devemos acrescentar a isto, durante este período, a mudança de mais de trinta cidades e povoados com nome de santos (Da Costa, 1997:94), ao que cabe também somar constantes enfrentamentos e manifestações anticlericais nas Câmaras, assim como nos jornais relacionados principalmente com as elites batllistas.

O conjunto de manifestações anticlericais podem ser resumidas nos denominados “banquetes da promiscuidade”, onde os simpatizantes do anticlericalismo faziam grandes churrascadas frente à catedral de Montevidéu nem mais nem menos do que nas sextas-feiras da Semana Santa. (Da Costa, 1997, 94-95).

Os permanentes ataques por parte da imprensa batllista à Igreja e a peculiar marca “civilizatória” que dava a alguns âmbitos estaduais, mostra às claras o papel substitutivo que se outorgava o Estado. Logo, quando em 1914 a “Liga de Damas Católicas” organiza uma campanha para estender “o reinado de Jesus Cristo no Uruguai”, por meio da simbólica “entronização do Sagrado Coração de Jesus” em cada lar, o popular jornal batllista “El Día” respondeu o 5 de janeiro de 1914  da seguinte maneira:

 

La ciencia conoce el bacilo religioso y conoce también el medio de asegurar a la humanidad una perfecta inmunidad.

El embrutecimiento mediante el fanatismo religioso y la superstición clerical está neutralizado por la luz de las escuelas laicas.

Pronto liquidaremos el último vínculo entre el Estado y la Iglesia, para asegurar de este modo la grandeza de la sociedad y la familia, comprometida por la acción funesta de los que, como el clero católico, abominan de las dignidades familiares y sólo se preocupan de la sociedad para exprimirla y explotarla. Nuestro pueblo ilustrado acerca de la farsa clerical, se ha redimido del yugo de los viejos ídolos. (Barrán e Nahum, 1985:47).

 

O processo de privatização da religião católica teve seu sucesso. Também a implantação da religião civil foi particularmente bem sucedida.[18]

Lembremos, então, que neste processo de construção da nação laica temos, por um lado, a expulsão da Igreja Católica de âmbitos públicos que passam a ser considerados público-estatais enquanto ficam sob jurisdição diretamente estatal. “Público” e “estatal”, serão categorias que a partir do período que expomos ficarão fortemente unidas no Uruguai mediante três modalidades: público, enquanto gestado diretamente a partir do Estado; público enquanto aparente “espaço neutral” que permite a coexistência dos “diferentes” (diferenças  religiosas, culturais, etc.) a partir das garantias legais e dos valores presentes na religião civil uruguaia (liberdades públicas); público enquanto espaço não somente garantido pelo Estado mas também como espaço preferencial das representações e mitos  outorgados pelo Estado-nação.

O Estado uruguaio - marca que com vicissitudes não conseguirá reconverter até hoje em dia - tornou-se nesta etapa histórica uma espécie de “fazedor da nação”, absorvendo e dando a maioria dos elementos que serviriam para a construção identitária do Uruguai.

Primeiro, assegurava-se este papel  expulsando a Igreja Católica dos lugares que ela mesma tinha produzido. Este aspecto é mais do que importante na medida em que o Uruguai estava configurando-se como nação com elementos populacionais heterogêneos: as correntes migratórias, com suas diferentes pautas culturais, comportamentos sociais, confessionais, etc., podiam circular em âmbitos onde as particularidades não eram em princípio questionadas por uma religião ligada à nação.

Os “espaços neutros”, assegurados pelo Estado-nação através das denominadas “liberdades públicas” permitiam, a alguns, exercer com soltura sua liberdade religiosa pela primeira vez. Mesmo assim, a interpelação à qual serão submetidos - tanto a população autóctone quanto a importante avalanche  de imigrantes - a realidade em fim, do que Darcy Ribeiro denomina “povos transplantados” (Ribeiro,1985) , radicará na moldagem que estabelecerá, não já uma religião que monopoliza o Estado, mas um Estado que é o principal produtor de uma religião.

Entramos, então, no segundo aspecto relevante da gestação da nação laica, através da dimensão à qual fazíamos referência no começo deste trabalho: o fato de que o Estado decidiu anular a simbologia católica no âmbito público, não significou uma anulação do catolicismo senão a sua privatização, assim como a pluralidade religiosa trazida pelos imigrantes (diferentes correntes do protestantismo, judaísmo, divisões da Igreja Ortodoxa Russa, vertentes religiosas provenientes do mundo árabe - e aqui corresponderia acrescentar um longo etcétera, em função dos diferentes grupos de imigrantes), tampouco resultou numa manifestação aberta e visível das mesmas.

Todo o campo religioso  passou, no Uruguai,  por uma forte modelização que incluiu a sua privatização. O “jacobinismo” que, não  esqueçamos, era produzido a partir de um “reformismo desde o alto” e não continha o grau de violência não simbólica de seu êmulo inicial,  impôs-se ao delimitar um âmbito público fortemente laicizado, com uma grande presença da religião civil da nação, e um âmbito privado no qual os cidadãos podiam, eventualmente, cultivar suas diferenças mais marcadas de índole variada. A laicização uruguaia foi anticatólica, embora não permitisse que as manifestações religiosas não católicas trazidas pela imigração ocupassem instâncias públicas, e desalentou inclusive que as diferenças culturais se magnificassem neste mesmo âmbito.

Assim, por exemplo, as posturas anticlericais do Estado foram vistas com simpatia pelos grupos de imigrantes não católicas (e inclusive católicos que vinham da experiência do catolicismo ultramontano espanhol ou italiano), na medida em que permitia-lhes desenvolver suas crenças com tranqüilidade. Ao mesmo tempo, esta simpatia limitava-se quando a religião civil queria impor-se enquanto “anti-religiosa”, em termos gerais. (Caetano, 1995:7).

A pergunta é: como consegue um Estado ser o principal agente de uma religião civil e impô-la no marco de uma instância política que bem poderíamos chamar de “democrático-liberal” e reformista?

Neste sentido, cabe fazer referência à afirmação de Da Costa, no sentido que: "O Uruguai foi construindo o seu próprio modelo de relação entre o Estado e religião, instalando o primeiro na esfera do público e deslocando em direção ao privado e íntimo o lugar social da religião" (Da Costa, 1997:93).

A afirmação - geralmente correta - corre o risco de ser mal interpretada, pois uma imposição do Estado na esfera pública, bem pode ser entendida como absorção da mesma por parte do Estado.

Isto ocorrerá claramente nos regimes autoritários, situação bastante afastada do espírito democrático-reformista do batllismo. De acordo com Giner (1994), a religião civil implica a sacralização da “politeya”, ou seja, sacralizam-se as modalidades de participação dos cidadãos habitantes da “polis” (sem esquecer a capacidade mobilizadora da aparelhagem política e político-estatais) e ao mesmo tempo, a religião civil, como seu nome o sugere:

 

…pertenece a la sociedad civil (…) El auge de la religión civil es concomitante con el avance de la privatización y de la  democratización. Por eso no hay sociedad civil ni religión civil bajo el totalitarismo: la movilización directa del pueblo, su penetración por una policía estatal, la supresión de su vida privada y de la tolerancia de las iniciativas grupales para la consecución de fines específicos (movimientos sociales autónomos), por no hablar ya de partidos políticos, imposibilitan el nivel estructural (sociedad civil) y el cultural (religión civil) de una politeya democrática y plural. (Giner, 1994:149).

 

O problema talvez possa ser resolvido se considerarmos que, para o caso uruguaio, o processo de implantação da nação laica ocorre, como já foi assinalado, no marco de uma incipiente sociedade civil fraca e dispersa (Caetano, 1995), que o Estado começa a arbitrar, gerar e paternalisticamente “conduzir”, inclusive produzir o seus “lugares”, sem anulá-la. Fica claro que a diferença entre terror e hegemonia deve estar aqui presente. Mesmo assim, a importante presença estatista, outorga marcas   muito peculiares  ao âmbito público, lugar “natural” da religião civil. Este âmbito público-estatal (no sentido já esclarecido) se caracterizará, como dissemos, pela a) existência das liberdades públicas, valores fundamentais da religião civil; b) uma forte presença da mencionada religião civil através de instâncias institucionais (escola, colégio, saúde, empresas estatais) que deixarão a marca simbólica e não simbólica do Estado-nação; c) privatização e supressão (no âmbito público) de outras religiões “particulares”[19] .

Os aspectos b) e c) são o que em certa maneira, ao nosso entender,  tornam peculiar a nação laica uruguaia. Porque ela não somente tentou uma mudança semântica, rupturista e substitutiva das religiões “particulares”, tentando mostrar, como a efígie da totalidade, senão que, em função do próprio projeto de nação tentou também suprimir  as diferenças do âmbito público, fossem elas de corte religioso e/ou de corte cultural.

É neste sentido que se pode entender, a título de exemplo, a cálida recepção da imigração judáica, e ao próprio tempo, a negativa por parte de Batlle para erigir seu próprio cemitério. O fato, apontado entre outros por Viñar (1992), ressalta de que forma igualdade democrática e homogeneidade entendiam-se como homólogas.

O âmbito público tendeu logo à homogeneidade: não somente se tratava de construir uma nação onde pudessem sentir-se representadas as heterogeneidades dos diversos tipos mas também que as mencionadas heterogeneidades passassem pela peneira  de tornar-se nacionais.

Neste sentido, se a educação pública (primária, colegial e superior) era um caminho de ascensão certa para a massa ingente de imigrantes e seus filhos, também era “culturicida” de alguma maneira, na medida em que tinha um objetivo claro: produzir uruguaios a partir de uma massa culturalmente heterogênea (Demasi, 1995)[20].

Resulta  interessante que alguns trabalhos (Romero, 1996) chamem a atenção sobre a privatização das diferenças culturais destes imigrantes, aspecto que em geral é descuidado pelos estudiosos uruguaios da religião[21]. Na integração do Outro, o sistema educativo e principalmente o escolar teve  um papel fundamental:

 

La educación primaria (…) promovió en el Uruguay uno de los índices de alfabetización más altos de América Latina en 1908 (58% para el país, distribuído en un 75% para Montevideo y 50% para el interior ruralizado), incorporó a los inmigrantes a un tipo de cultura que desde cierto ángulo los nacionalizó pero desde otro europeizó al país pues esa reforma de la educación se inspiró en modelos ideológicos extrangeros, europea en su filosofía y estadounidense en su pedagogía, y había sido llevada a la práctica por maestros-líderes en muchos caso de origen español y liberal. De este modo, la escuela a la vez que uruguayizó a los inmigrantes, europeizó a los criollos(…)Lo foráneo o extranjero pasó a formar del ser nacional(…)la concepción dominante de nacionalidad entre 1900 y 1930 implicó la aceptación del otro como parte constitutiva del nosotros. (Barrán, 1998a:30).

 

 

O desestímulo à diferença gerou, no momento histórico abordado, a fundação do que Rama, talvez exageradamente, denominou “sociedade hiperintegrada” (Rama, 1987). A heterogeneidade da população autóctone e imigrante foi “hiperintegrada” através de um denso processo de escolarização - parte de um disciplinamento generalizado de acordo com  o historiador Barrán (1990) - no qual inculcava-se as narrativas da nação, suprimindo qualquer possibilidade de enunciar ou tornar visíveis publicamente as diferenças. Esses templos da “religião civil” eram gratuitos (obrigatórios) e laicos[22].

A nação laica, conseguiu aí um aspecto importante de sua inculcação  e se o papel do capitalismo impresso é relevante para formar as comunidades imaginadas (Anderson, 1997), o papel da escolarização massiva torna-se sem dúvida fundamental para gestar a nação. A nação laica insistiu nas escolas para a configuração de um igualitarismo homogeneizante, despido de qualquer particularidade (a não ser a particularidade da nação socialmente compartilhada).

De tempos imemoriais, e até hoje em dia, aparece nas certidões  escolares uruguaias uma frase de José Pedro Varela, fundador da reforma educativa:

 

Los que una vez se han encontrado en los bancos de una Escuela, en la que eran iguales, a la que concurrían usando de un mismo derecho, se acostumbran fácilmente a considerarse iguales, a no reconocer más diferencias que las de las aptitudes y las virtudes de cada uno: y así, la Escuela gratuita es el más poderoso instrumento para la práctica de la igualdad democrática.  (Varela, 1989:212)

 

 

Aliás, as heterogeneidades foram expulsas de outras instâncias estatais, ao mesmo tempo que as mencionadas instâncias serviram também para “hiperintegrar” essas heterogeneidades. Isto porque o batllismo gera também o primeiro desenho de Estado social benfeitor uruguaio capaz de moldar as heterogeneidades.

Desde o “empresarismo” estatal (com um uso incipiente do clientelismo político), passando por um enorme conjunto de leis e iniciativas sociais, estabelecendo-se como árbitro de conflitos sociais,  o Estado não só tornou-se produtor da religião civil, mas lugar privilegiado para que a nação tivesse nele um lugar exemplar de identificação. Mas isto desde uma perspectiva particular: a ágora endeusada - núcleo da religião civil – que via no Estado seu árbitro, seu produtor e a garantia jurídica da sua existência.

Quanto à construção de “espaços neutros” (ou seja os lugares onde a religião civil não era “representativamente” visível), os mesmos também foram úteis para a hiperintegração  porque, como já dissemos, baseavam-se na consagração das liberdades públicas (valores da religião civil) e na ausência de particularidades manifestas. O próprio laicismo colaborou para isto: a “desguetização” dos grupos imigrantes deveu-se ao espírito liberal imperante no âmbito público. Como troco, estes deviam “tornar-se uruguaios”, ou seja, defensores da religião civil existente (coisa que a maioria fez, inclusive nas suas opções políticas) e guardar pudicamente suas peculiaridades religiosas e culturais para clubes e casas[23].

A nação laica, exprimiu-se então como projeto tendente ao desestímulo das peculiaridades. Dava-se assim

…la aspiración a conformar una sociedad nacional homogénea, concebida como crisol de razas bajo la égida de un proyecto político unificante y democratizador, que automáticamente posibilitara la absorción de las particularidades subculturales en la emergencia de una nacionalidad moderna de país. (Porzecanski, 1992:52).

 


 



    [1] De acordo como o mesmo autor, “La primera Constitución del Uruguay independiente, en su artículo 60 establecía: `La religión del Estado es la Católica Apostólica Romana´. Com esta consagracão, " La influencia del ancestro colonizador y evangelizador ibérico en su auge restaurador con la expulsión del Islam, puede más que la Revolución Francesa y que la independencia americana en el Uruguay del SXIX (Bayce, 1992:2).

 

 

 

    [2] O primeiro batllismo ou época batllista, tem o seu principal referente na figura de José Batlle y Ordóñez. Por “primer batllismo” devemos entender, em termos muito amplos, um projeto político que transcende a figura presidencial (e inclusive os integrantes de uma só comunidade política, por outro lado não homogênea) e na qual destacaram-se diversos agentes políticos e sociais na tentativa de construção de uma democracia pluralista e de forte conteúdo social e não precisamos dizê-lo, na conformação da “nação laica”. Este “batllismo primeiro”, que vigorará até aproximadamente a década dos ’30, tem sua continuidade no “neo-batllismo” (1946-1958), protagonizado (entre outros) pela figura do Presidente da República Luis Batlle Berres. Contudo, este “neo-batllismo”, vai reiterar (e afirmar) os mitos e representações emblemáticas já naturalizados como parte da identidade nacional.

A este respeito, Caetano estabelecerá: “ Más allá e un tópico que habría que comenzar a investigar mucho más intensamente, nuestra impresión es que esta ecuación identitaria del “Centenario” no pudo ser recreada o alterada de modo decisivo en el período posterior a 1930.”(Caetano, 1992:89).

Acrescentemos então, que esta “equação identitária” no dizer de Caetano (Id.Ibid.) conseguiu uma perdurabilidade que, embora acabe de ser elaborada nos primeiros decênios do século XX, transcende essa dimensão temporal, na medida em que as mito-práxis futuras se alimentarão dos mitos e representações conformados nesse período de tempo.

Segundo Achugar: “Con Batlle y el fortalecimiento (o la constitución) de un Estado monopólico(…) el aparente éxito o funcionamiento de dicho modelo (…) contribuyó a consolidar tanto la mentalidad como la suposición de que la solución ofrecida por el modelo era la adecuada para el país.”(Achugar, 1992:155).

 

 

    [3] -“Arturo Ardao ha comprobado que una concepción ética de la sociedad y el derecho fue la base filosófica del reformismo, al menos si nos referimos a su personalidad descollante, Batlle y Ordónez. Una moral, en efecto, de sello tolstoiano, no católico, en la que el hombre era el centro de una obsesión a veces hedonista, sin que nada, y menos una Institución lo trascendiera; imbuida de `cierta piedad difusa, casi cósmica´hacia el ser débil, fuera de la naturaleza que fuera (humana o animal); vertebrada por una `concepción romántico-anarquista-naturalista, un poco a lo Ibsen, del individuo y las construcciones sociales´, al decir de Carlos Real de Azua." (Barran; Nahum, 1985:39).

 

    [4] - “El conductor de este esfuerzo fue Batlle y Ordónez (…) Sus reformas iniciadas en 1904, bajo la inspiración de una filosofía progresista y democratizante en la constitución de 1917, significaron un impulso renovador único en el continente, que echaría las bases de la primera democracia latinoamericana.” (Ribeiro, 1985:479).

 

     [5] Seguindo uma línea bastante consensual na historiografia nacional, estabelece-se que o século XIX foi um preâmbulo da cristalização do primeiro modelo de identidade nacional. O conjunto de guerras civis que foram acompanhadas por alianças e enemizades com facções argentinas e brasileiras (mais a intervenção de potências européias em diversos conflitos), outorgaram variadas marcas à emergência de uma identidade nacional que, porém, alcança a sua maturidade nos anos 1900: "Si la identidad nacional de los uruguayos no está entonces prefigurada desde los remotos tiempos coloniales, tampoco durante la Revolución ni durante las primeras décadas de vida independiente, lo que podríamos llamar -no sin equívocos- `proyectos nacionalistas´ se muestran y se despliegan de manera coherente. Las trayectorias -personales y colectivas- resultaron mucho más azarosas y cambiantes, en consonancia además con el contexto de la época." (Caetano, 1992:82).

 

    [6] Em 1904 terminou a última guerra civil no Uruguai protagonizada entre o Partido Blanco e o Partido Colorado (este como o seu máximo dirigente e presidente da República, José Batlle y Ordóñez). Com este capítulo, finda (excetuando algum conato revoltoso sem importância em 1910), o ciclo de guerras civis, que surge poucos anos depois da independência da República (1830). Ambos os partidos surgem durante uma das tantas batalhas (a batalha de “Carpinteria” em 1836) depois da independência e continuam a existir até os nossos dias.

Dado que Aparício Saravia, o máximo dirigente do Partido Blanco era católico - bem que numa postura não necessariamente majoritária dentro da diretiva deste Partido (Methol Ferré, 1969) - o presidente Batlle, triunfador deste choque armado dirá: “Hemos derrotados a los blancos y a los negros”. Los negros eran los curas.”(Methol Ferré, 1969:49).

    [7]  O primero antecedente do protestantismo no território que posteriormente viria a ser o Uruguai teve seu primeiro registro com as invasões britânicas de 1807. “...el primer contacto del espíritu y las formas de la religión protestante con nuestro catolicismo colonial de raíz hispánica. El invasor inglés ocupó Montevideo durante sólo siete meses(...) En lo que a religión se refiere, una innegable simiente de liberalismo quedó sembrada (...) de respeto al culto católico (...) los soldados y comerciantes ingleses adictos a sectas distintas, celebraron sus ritos propios, dándose el espectáculo, el primero quizá en Sudamérica, de la existencia de religiones diferentes en la ciudad colonial.” (Ardao, 1962:126-127). 

 

 

    [8] Corresponderia relativizar esta afirmação do historiador Barrán. Embora a Igreja Anglicana tivesse em Montevidéu sua atuação sem que as apologias católicas anti-protestantes  ecoassem nas limitações que eventualmente o estado pudesse colocar em sua ação, outra foi a realidade no interior do Uruguai. Mencionemos aqui a expulsão dos Valdenses da cidade de Florida no ano 1858, perseguidos tanto pelo jesuíta Majesté quanto pelo então Chefe Político Caravia. Apesar do apoio que receberam do Ministro do Interior Antonio de las Carreras, as perseguições continuaram. Ver: Tron e Ganz (1958).

 

 

    [9] "Jerárquicamente la Iglesia uruguaya dependía de la antigua Sede Episcopal de Buenos Aires. El 2 de agosto de 1832 Gregorio XVI creó el Vicariato Apostólico del Uruguay y designó de titular a Larrañaga quien ocupó el cargo hasta su muerte en 1848. Los vicarios posteriores fueron: Lorenzo Fernández (1848-1852), Benito Lamas (1854-1857), Juan Domingo Fernández - actuó como Pro-Vicario - (1857-1859), y Jacinto Vera (1859-1878) (…) Vera (…)en 1878 se convirtió en el primer obispo uruguayo al crearse la Diócesis de Montevideo." (Sansón, 1998:22-23).

"La Iglesia uruguaya estuvo regida durante esta época por Jacinto Vera (Vicario Apostólico entre 1859 y 1878, consagrado Obispo en 1865, titular a partir de 1878 de la flamante Diócesis de Montevideo con juridicción sobre el país), Inocencio de María Yéregui (1881-1891), y Mariano Soler (Obispo a partir de 1891 y Arzobispo desde 1897, fecha en que Montevideo fue elevada a la categoría de Arquidiócesis y se crearon las diócesis sufragáneas de Melo y Salto). Vera y Soler fueron las figuras más importantes" (Sansón, 1998:33).

“Muerto Monseñor Soler en 1908 le sucedió interinamente Ricardo Isasa, con el título de Administrador Apotólico(…) Independiente la Iglesia del Estado (…) el Vaticano designó  Arzobispo a Juan Francisco Aragone. En 1940 lo sustituyo Antonio María Barbieri, que era ya Arzobispo Coadjutor desde 1936.” (Ardao, 1962:104).

 

 

 

    [10] "La categoría `católico-masón que unos años más tarde perdería significación, era común dentro del elemento religioso de la época, expresado en una tendencia `liberal´, no dogmática, profundamente anti-jesuítica y anti-ultramontana del catolicismo uruguayo. En ese sentido, no resultaba nada extraño en aquellos años que una persona fuera católica y al mismo tiempo perteneciera a alguna logia masónica, lo que entre otras cosas venía a testimoniar la dimensión `cultural´de una definición de fe en aquel contexto de época."(Caetano e Geymonat, 1997:54).

 

 

 

    [11] “En Mons. Jacinto Vera, por ejemplo, por muchos motivos que iban desde su azarosa peripecia personal hasta sus posturas en materia doctrinaria, resultó por demás visible esta perspectiva(…)`Las circunstancias - decía Vera en una Pastoral de febrero de 1867- en que se halla nuestra Santa Religión son muy graves. No sabemos que nos depara el porvenir(…) Los malvados(…) la quieren destruir completamente y uniendo su ciencia llena de vanidad con su falsa erudición atacan sin pudor las doctrinas de nuestros Libros Sagrados(…) mientras prodigan al Padre Santo, al inmortal Pío IX, los insultos más sacrílegos y las más ridículas acusaciones´.

El rechazo al liberalismo y en particular a los `católicos liberales´se unía en  Vera a una exaltada adhesión al magisterio papal, profundizaba aun más en el caso de Pío IX, a quien profesaba una gran admiración." (Caetano e Geymonat, 1997:19).

 

 

    [12] Sobre a existencia da maçonaria no Uruguai existem antecedentes que poderiam remontar-se até a  época colonial. Ver Ardao (1962:118).

 

 

    [13] Trata-se de um editorial escrito por Isidoro de Maria no jornal “La Prensa Oriental” de 18 de abril de 1861.

 

 

    [14]- O Presidente Berro, (Presidente da República desde 1860 até 1864) e responsável pelo decreto de secularização dos cemitérios (18 de abril de 1861), não parece ter sido maçom. Ver: Barrán (1988, 1998b).

 

 

    [15] Methol Ferré levanta  a seguinte passagem da mencionada revista (“La Revista Literaria”), típica representante das concepções de progresso e das eventuais interferências católicas com o  mesmo: "El silbido de las locomotoras del SXIX no nos dejarán oir las maldiciones del Vaticano expirante. Las olas tumultuosas de la libertad que avanzan rápidamente ahogarán sus últimas palabras, y el hossana de la justicia será el único canto que nos arrulle.” (Methol Ferré, 1969:43). 

 

 

 

     [16] “ A diferencia de otros países americanos como Brasil, México,Chile, donde la influencia de Comte fue muy grande, no había penetrado aquí antes de hacerlo el evolucionismo sajón; y tampoco penetró luego, a no ser a través de referencias ocasionales o indirectas (…)Darwin, cuyo nombre, más que Spencer, fue la verdadera bandera inicial de nuestros positivistas.”(Ardao, 1968:252, 253).

 

 

 

    [17] “El anticlericalismo ganó la calle y demostró poseer un elevado grado de militancia(…)Por ello ocurrieron las giras de propaganda por el interior del país(…) la creación del “Centro liberal” y la “Asociación de propaganda liberal” en 1900 con sus 54 Comités y delegaciones en el interior del Uruguay de 1903 así como sus 60 folletos anticlericales con un total de 292.000 ejemplares (!) en 1905.” (Barrán, 1988:8).

 

 

 

    [18] “En el Uruguay existe la creencia de que la educación es el supremo fin, cuando no deja de ser un medio(..) He visto numerosas escuelas en el Uruguay y me ha asombrado ver que los niños sabían quién es Bernard Shaw o Lenin, pero desconocen en absoluto el nombre de los apóstoles.” Ver: El Uruguay es un país gobernado por locos. Declaraciones de la célebre exploradora Rosita Forbes. Aquí se hace la experiencia de las leyes más utópicas. In: La Tribuna Popular, Montevideo, 5 de febrero de 1932: 8. 

 

 

    [19] O breve corte autoritário que aconteceu no Uruguai em 1933 conhecido popularmente como “dictablanda” –ditamole- (Faraone, 1970:82) não significou uma ruptura radical para a religião civil uruguaia. Finda, em 1938, como eleções livres e (por vez primeira) a consagração do sufrágio femenino.

 

 

    [20] Barrán aponta que, para o caso uruguaio “…el factor crucial de la revolución demográfica fue la inmigración europea. Franceses, italianos y españoles hasta 1850, italianos y españoles luego, a los que se agregaron en la década 1920-1930 contingentes de Europa Cental, llegaron en cinco o seis oleadas sucesivas.“ (Barrán, 1998a:29).

 

 

 

    [21] Referindo-se às diferenças culturais trazidas pela avalanche imigratória, Romero estabelece : “Diferencias a las que, por otra parte, no tuvieron por qué renunciar sino retrotraer a esferas más privadas poniendo solamente en la escena pública aquellos rasgos que permitían una intercomunicación generalizada, en un nuevo código que fue en sí un bricollage.”(Romero, 1996:116).

 

 

 

    [22] O desestímulo à diferença não significa a eliminação absoluta dela. A ”religião civil” uruguaia jactou-se desde cedo de seu espírito cosmopolita. Não obstante, afasta-se, com certeza, da visão, por exemplo, de Ulf Hannerz (1994) acerca do cosmopolitismo: “O cosmopolitismo mais autêntico é, acima de tudo, uma orientação, uma vontade de se envolver como o Outro.” (Hannerz, 1994:253).

 

 

    [23] Cabe apontar aqui, a título de exemplo, o culto desenvolvido a José Batlle y Ordóñez, por parte de algumas correntes migratórias russas que vieram em 1913 ao Uruguai fugindo da persecução da Igreja Ortodoxa Russa e o Czarismo. Sobre esta corrente migratória ver: Pi Hugarte (1996).